sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Hoje vi...

... um carro com uma capa.


E pensei: nunca mais vi carros com capas. E lembrei-me da seca que era, quando era miúda, ajudar os meus pais ou os meus avós a pôr a capa no carro. Que grande seca. Depois pensei que nos dias que correm já ninguém tem tempo para andar a meter capas nos carros. Mas era uma coisa boa; a pintura e a chapa durava mais assim. Mas isso agora não interessa nada, que o pessoal pode não ter dinheiro, mas quer é uma boa desculpa para arranjar carro novo. Se bem que, mesmo sem capa e à torreira do sol leva muito até que o carro caia de podre, pelo que também não será por aí. Não, acho que é mesmo por uma questão de tempo. Será sempre complicado para uma mãe ou pai de família tentar sair de casa com as crianças por entregar nas escolas, infantários, afins e até mesmo avós, assim muito em cima muito em cima da hora de entrar no trabalho, e ainda estar a tirar a capa ao carro.

Lembro-me que, se colocar a capa no carro era uma seca, tirá-la ainda era pior. Quando eu era miúda, saía de casa toda apetrechada para as nossas viagens. Levava um rádio para fazer a reportagem. Ou o walkman que o meu primo me havia trazido da Bélgica e que me havia oferecido (acho que isso já foi no tempo em que já não se punham nem tiravam capas aos carros); outras vezes levava simplesmente a boneca para brincar com o cão que abanava a cabeça na parte de trás do nosso Ford Cortina cor de burro quando foge, em cima de um carpélio cor de rosa, muito fino, muito fino. Esse, esse Ford Cortina cor de burro quando foge é que andava sempre metido na capa. Até porque era no Ford Cortina que nós íamos à terra, lá para os lados do Alentejo, aí uma vez por ano, portanto pôr e tirar a capa não fazia grande mossa.


E lá ia eu toda apetrechada, cheia de vontade de iniciar a viagem, até que me deparava com a bela da capa por tirar. Ainda quando eu ficava só a olhar, ainda vá; o pior foi quando eu cresci e comecei a ajudar. Esse é que foi o grande problema. Eu detestava tirar aquilo, dobrar aquilo, estava tudo sujo, ficava sempre tudo mal dobrado, por mais que se fizesse, nunca se conseguia dobrar aquilo como deve ser, irritava-me solenemente, como ainda me irrita varrer a casa e depois verificar que há porcarias de migalhinhas que ficaram esquecidas no chão, as ordinárias, armadas em carapaus de corrida, a escapulirem-se por entre os "cabelos" da vassoura (era assim que eu lhes chamava quando era miúda). Que raiva. Que ódio.

E dei por mim a pensar quem é que ainda se daria ao trabalho de colocar a capa no carro. Um carro grande, com ar de ser novo. Pensei que deveria ser de alguma pessoa reformada, um avô ou uma avó, ou bisavô ou bisavô (e vai daí não, que as actuais bisavós não conduziam nem conduzem... e os bisavôs já se vêm gregos para renovar a carta). E vai daí, talvez eu esteja apenas ser preconceituosa... talvez o carro da capa pertença a uma atribulada família de quatro filhos, todos pequenos, todos chorões...

Sem comentários: